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Tomos de Eternidade

Esta semana pretende falar de algo cujo verdadeiro significado me parece, escapa a muita boa gente.
A razão que levou ao sucesso astronómico da personagem “Stone Cold” Steve Austin.

Quando se questiona um fan de wrestling relativamente ás associações que liga a esta personagem, as mais comuns serão: cerveja, a “Stone Cold Salute”, os palavrões, os Stunners a torto e a direito em figuras de autoridade, o ser um heel cuja atitude era considerada “cool”.
Resumindo, temos aqui as marcas de um rebelde.
Stone Cold Steve Austin era de facto um rebelde, e muitos dirão que o seu sucesso adveio desta rebeldia. Mas isso é um erro, ou antes dizendo, é uma simplificação excessiva do assunto. Rebeldes é algo que não tem faltado desde as Monday Night Wars, mas nenhum deles chegou ao nível de Austin.

Mais do que isso, Austin foi durante grande parte da sua carreira na WWE um Rebelde sem causa, um conceito interessante em si, mas extremamente passageiro, passado algum tempo esse efeito desaparece(ou até aparecer o próximo rebelde sem causa).
Ele foi um rebelde sem causa quando se livrou do Ted Dibiase.
Ele foi um rebelde sem causa enquanto combateu o Bret Hart(embora estivesse mais que decidido em rearranjar a fuça do Bret, ele ainda era um rebelde sem causa).
Ele foi um rebelde sem causa enquanto perseguiu o Shawn Michaels.
Foi um rebelde sem causa em todo o ano de 2001, e final de 2000.

Mas ele encontrou uma causa na noite uma semana depois da Wrestlemania XIV, ao mandar o Vince McMahon dar uma volta com um Stunner á mistura.
Podem perguntar; “mas como é isto diferente do que ele fazia á meses?”
A resposta é simples. Simbolismo.

Na noite a seguir á WM o McMahon afirmou que não gostava nada da ideia de ter o Austin como campeão da WWE, uma vez que ele não aprovava a atitude dele, e que as coisas teriam de ser mudadas “a bem ou a mal”. O simbolismo desta situação é termos a figura do patrão, do chefe, do corporativista a decidir mandar na vida dum trabalhador, dum trabalhador de artes manuais, é uma clara cena de opressão, o poderoso patrão a impor a sua vontade sobre o pobre trabalhador, oferecendo a velha escolha, “ou fazes como eu quero, ou é rua contigo.”

Na vida real pouco mais a fazer do que calar e fazer se quisermos manter o belo do emprego. Claro que no wrestling a coisa não é assim...
Na semana seguinte o Austin apareceu todo bem vestido, com uma atitude toda humilde em relação ao McMahon. Mais uma vez o poder corporativo se tinha imposto sobre a vontade do trabalhador. No entanto quando vão posar para uma fotografia, o Austin arranca o fato dá um murraço nas jóias de família do Vince, e tira uma fotografia a posar sobre o corpo do chefe.

Este a meu ver, foi o verdadeiro momento que definiu a carreira do Steve Austin. Quando o Austin se rebelou contra o autoritismo da chefia. Quando fez o que milhares de trabalhadores apenas podiam sonhar em fazer. Retaliar fisicamente sobre o seu chefe, e evitar as nefárias consequências do despedimento e do processo judicial que uma agressão incorreria.
Austin nesse momento tomou o lugar de herói de todos os trabalhadores manuais, os “Blue-Collar Wokers” dos Estados Unidos.
Toda uma classe de trabalhores encontrou em Austin um ídolo.

Foi um momento poderoso, e durante o ano seguinte, Austin e Vince entrariam em guerra. Vince tentando fazer valer o seu poder de entidade empregadora, e Austin tentando subverter essa mesma autoridade. E o público delirava sempre que o Austin conseguia sair por cima, sendo essa uma vitória para toda essa classe, e desesperavam sempre que o McMahon conseguia superar o Austin, ansiosamente esperando pela altura em que este conseguiria a vingança sobre o patrão.

O que aconteceu com Steve Austin foi que todas estas pessoas se projectavam na figura dele. Todas estas pessoas teriam razões de queixa do seu emprego, quer por trabalharem muito, por receberem pouco, por terem chefes autoritários, por não verem reconhecido o seu esforço, etc.
Mas havia muito pouco que eles pudessem fazer em relação a essa situação, certamente não poderiam agredir o patrão, e esperar que este os desafiasse para um combate. Iam parar ao olho da rua em menos de nada(ainda mais nos Estados Unidos, onde se pode despedir trabalhadores com um estalar de dedos). Logo, o feudo entre Austin e McMahon era um escape da realidade, o único escape que eles podiam usufruir. Quantos dos milhões que viam Austin não se imaginavam na pele dele, com o seu chefe no lugar do McMahon?

Muitos diria eu. Talvez a maioria.

E era isto que fazia do Austin uma super-estrela, da mesma forma que na década anterior o Hulk Hogan era o “All-American Hero”. Ambos eram super babyfaces( o Austin andava a trilhar o caminho do face desde o início do feudo com o Bret Hart em 96, tendo o derradeiro turn no famoso combate da WM XIII. Essa história do tweener é um disparate total, ele era um heel que estava calmamente a passar a face. Simplesmente foi feito no espaço de vários meses, e não de um dia para o outro), com os quais uma enorme parte da audiência se identificava, e ambos tendo um derradeiro feudo que os catapultou para a imortalidade( Andre the Giant e Vince McMahon). Ambos se tornaram dos maiores nomes do wrestling mundial( o Hogan é O nome do wrestling), marcando toda uma geração.

Resumindo, para mim o que definiu Steve Austin não foi a rebeldia em si, pois rebeldes há muitos, e nunca são interessantes por muito tempo. Mas foi que durante sensivelmente um ano, Austin tinha uma causa pela qual combatia, ainda que ele não andasse a apregoar ao 4 ventos qual ela era( nunca ele teve uma promo em que dizia que fazia aquilo em nome dos Blue-collars do país), mas o simbolismo estava inegavelmente lá, ainda que pudesse não ser percebido a um nível consciente. A maioria do público não era capaz de dizer qual era exactamente a razão que os levava a apoiar tanto o Autin. Ela simplesmente existia a um nível subconsciente.

É a subtileza a trabalhar. As pessoas não precisam que lhes digam directamente á cara certas coisas, pois a interiorização do assunto é feita de qualquer forma.
E até á próxima semana.

manjiimortal
“ Death is merciless. But let me tell you... Not being able to die is crueller still.”

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