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O que não faz sentido em combates de wrestling?


Bem, esta semana devido a estar ausente para férias não pude responder às perguntas que os leitores certamente me fizeram, e pela primeira vez em 54 semanas, não postarei a rubrica O Wrestling em Revista. No entanto, deixo-vos com uma crónica minha, cujo objectivo é pôr-vos a pensar em coisas que não fazem sentido neste “business”.....

Um combate de wrestling, supostamente, é uma luta coreografada, no entanto, o objectivo é fazer os fãs acreditarem no que estão a ver de forma a serem criadas em si emoções que devem ser despertadas por meios sonoros, seja apoio, insulto, palmas ou vias a um determinado wrestler, mas também o silêncio, que muitas vezes conta muito do que se vê.

Esta modalidade, chamemos-lhe assim, é praticada um pouco por todo o planeta, e tal como as culturas espalhadas na Terra, também no pro wrestling há uma grande diversidade de estilos.

Na maioria dos casos, o primeiro estilo que entrou por nossas casas a dentro foi o da WWE, que se pauta sobretudo por contar uma história em ringue, envolvendo heróis e vilões, e geralmente com combates faseados, para que o resultado se pareça algo épico, tal como se de uma série se tratasse, em que o herói passa por imensas dificuldades mas com o seu enorme coração consegue dar a volta. No entanto, e para que se crie emoções no público e para este acreditar no que está a ver, convém dar-lhe realismo e convém que muita das coisas façam sentido.

Se viajarmos pelo Mundo, encontramos outros estilos, em Portugal, por exemplo, o estilo que é aplicado no WP e na APW é o estilo WWE, ainda que na APW na minha opinião se trabalhe de uma forma mais “Old School”, de forma a criar alguma diferenciação entre as personagens, na tentativa de lhes dar singularidade.

Mas adiante, no México temos acima de tudo uma coreografia excessiva, em que basicamente são despejados movimentos algo habilidosos que exigem bastante sincronização de movimentos, os combates não são muito faseados mas aquilo que os fãs mexicanos querem ver são grandes movimentos, dignos de super-heróis, e também por aí, é muito comum o uso de máscaras nesse país latino.


No Japão, e mesmo em companhias americanas independentes como a ROH, os combates são faseados, não por períodos de domínio por parte de um dos lutadores, mas sim por intensidade e tipo de wrestling aplicado, ou seja, os combates vão subindo de intensidade de golpes até ao final. Este estilo pauta-se pelo realismo, havendo por vezes golpes cujo objectivo é mesmo deixar marcas no adversário, sendo denominados como “stiff”.

Em outras companhias, algumas americanas e outras japonesas sobretudo, tenta-se dar ao wrestling um ar cómico, e por isso temos o Kenny Omega a fazer combates contra bonecas insufláveis e raparigas de oito anos, “Battle-Royals” de desenhos animados na CHIKARA, e por aí.

Noutros estilos, temos por exemplo demasiado “Hardcore” ou demasiado “spotfest”.

No entanto, vamo-nos centrar no que na maioria dos casos, mais vezes entra por nossas casas a dentro, o estilo WWE. Sendo a grande base de fãs da companhia os mais jovens, “marks”, fãs que acreditam no que estão a ver, para que eles tapem os ouvidos a quem lhes diga que isto é tudo a fingir, é preciso que seja-lhes apresentado um produto credível e realístico, mas será que isso sempre acontece, afinal, o grande tema deste artigo é: O que não faz sentido em combates desta indústria, sobretudo na WWE!

Porque é que nenhum lutador tenta o seu “finisher” logo de inicio?

Em raros combates na WWE vejo lutadores a tentarem o seu “finisher” logo de inicio, mas porque são em tão raros? Um “finisher” é, traduzido em bom português, o golpe final de um lutador, aquele golpe que termina combates por ser o mais potente do seu arsenal, e então, porque não tentá-lo logo de inicio? Não me parece envolver maiores gastos de energia ou ser mais arriscado que um movimento normal do “move-set” na maioria dos casos. E digo isto, falando sobretudo de submissões, e aí, por exemplo, Chris Benoit tentava sempre o “Crossface” do inicio ao fim, no entanto, outros lutadores não o fazem.

Será que não o fazem porque esse é o movimento mais estudado pelo adversário e que por isso se tenta surpreender? Bem, se isto fosse real, se eu tivesse que estudar o meu adversário, iria ver que todos repetem geralmente os mesmos golpes semana após semana, por isso, se a tentativa é surpreender, não metam o Orton a distribuir “Backbreakers”, “Angle Slams” ou “DDT’s”, esses movimentos são demasiado habituais, não é por aí que se surpreende um adversário. Porque é que em vez disso, ele não tenta o “RKO” ou o “Punt Kick” logo de inicio?


Por que raio assisto sempre ao mesmo molde de combate?

Por vezes ponho-me a imaginar: “Ok, hoje sou um ‘mark’ e o meu lutador preferido tem um combate importante num PPV, e tal como no PPV passado, o combate teve o mesmo molde, com o lutador que eu não apoio a ganhar vantagem cedo no combate, dominando o que eu meu preferido que a dado momento parece estar a recuperar mas acaba por não conseguir (“hope spot”), e vai continuando a tentar até um determinado momento em que consegue recuperar com uma sequência de algumas das suas melhores manobras (“comeback”) e depois o final foi emotivo, ao serem aplicados alguns dos melhores movimentos tanto do meu preferido, como do lutador que eu não gosto, acabando, por fim, por a vitória sorrir a um deles”.

Sim, porque raio o molde de combates é sempre o mesmo? Porque é que lutador que quando era “heel” dominava tanto que era impossível derrubá-lo e agora que é um “face” gigante está sempre no chão? Porque não assistimos mais vezes a lutas taco-a-taco? Porque é que o suposto herói e o melhor que há passa sempre mais tempo a ser dominado do que a dominar?

Os combates assim tornam-se previsíveis em termos de sequência de acontecimentos, e acima de tudo expõem uma ferida que revela toda a coreografia do produto.


Porque é que todos caem no mesmo erro centenas de vezes?

Há quem lhe chame de “moves” viciadas e de facto é isso que parece. No vídeo abaixo dou um exemplo com um golpe de John Cena, o “Spin Out Powerbomb”, também conhecido como “Proto-plex” ou então como “Proto-bomb”, se recuarmos aos seus tempos de OVW.

Como é possível que ele combata todas as semanas, e que em todas as semanas, após o seu adversário sofrer dois “Shoulder Blocks”, avance para uma “Clothesline” e falhe sempre, e pior que isso, vire sempre as costas a Cena, que lhe aplica este movimento, como é possível?

Aqui o wrestling pede todo o sentido, e a verdade é que são raríssimas as vezes em que alguém reverte o movimento.

Podia falar do mesmo em relação a outro movimento de Cena, o “Leg Drop” que ele faz da corda superior, sim, porque é o único movimento que ele faz lá de cima e mesmo assim os adversários continuam a levantar-se da mesma forma, dobrando as costas para que ele lhe acerte. O pior é que dão um “estrilho” de tal forma que consegue superar o irrealismo de alguém a ficar na borda do ringue só para sofrer um “DDT” do Orton, ou mesmo num caso que às vezes torna-se tudo menos credível, que é ter uma tentação natural em ficar pendurado na corda do meio quando se tem combates com o Rey Mysterio, ainda que pareça que tal foi propositado.

A sequência de movimentos que levam o Triple H a aplicar a “High Knee” também é sempre a mesma e sabe-se logo o que vai acontecer, isso para mim só descredibiliza o produto. Fiquem com o vídeo do tal movimento do Cena em que todos falham a “Clothesline” e dão meia volta só para sofrerem o golpe.




Porque há quem não faça o assentamento depois de um golpe com algum impacto?

Sim, a pergunta é: Porquê Shawn Michaels demora uns 15 segundos depois de ter feito o “Body Slam” a ir para a corda superior e aplicar um “Diving Elbow” e neste tempo todo está o adversário estendido no tapete quando podia ir fazer um “pin”? É que teoricamente, nos 15 segundos que ele demora poderia ter cinco assentamentos e quem sabe aí obter a vitória. Mas este, até é um mau exemplo, visto que um “Body Slam” é um movimento banal.

Mas vamos a mais, como o caso de John Cena que depois de aplicar o movimento do vídeo acima demora também uns 15 segundos a aplicar o próximo golpe, que no caso é o “Five Knuckle Shuffle”, perdendo tempo pelo meio para fazer as palhaçadas do “You Can’t See Me”. Pergunto-me porque depois de um movimento de impacto como este não tenta o “pin”.

No entanto, estes são os casos mais fáceis de identificar, de lutadores extremamente conhecidos, cujos movimentos estão na nossa memória, porque com outros de menos gabarito acontecem situações piores todas as semanas, e com golpes como “Powerbombs” e afins.


Porquê fazer movimentos mais fracos quando se pode fazer algo com maior impacto?


Sim, e é aqui especialmente que o wrestling japonês dá uma coça à WWE!

Na WWE faz-se “Suplexes” e “Body Slams” a dar com um pau, no entanto, pergunto, que se eu fosse um lutador legítimo e quisesse vencer o combate, se apanhasse o meu adversário em posição de “Suplex” para que o fazia cair de costas quando o podia pôr KO com um “Brainbuster” em que ele caísse de cabeça? O mesmo serve para um “Body Slam” ou para o próprio “Atittude Adjustment” de Cena que apesar das vitórias que lhe tem dado, continua a ser um movimento demasiado “soft”, sobretudo quando comparado com um “Death Valley Driver”.

São golpes que se correrem mal podem resultar em lesões graves, é verdade, no entanto, como fã de wrestling pode-te saber a falso.

E quando falo em movimentos mais fracos, falo também dos tempos por vezes demasiado exagerado que o “mat wrestling” tem em certas contendas, que ao contrário dos combates entre Benoit e Angle que todos nós sabíamos que eles de algum lado poderiam sacar do “Ankle Lock” ou do “Crossface”, actualmente é usado para encher chouriços, sendo que qualquer um, desde o fã mais ignorante até ao mais entendido na matéria, sabe que não vai dar em nada, e pior que tudo, muitas vezes é visível que quem está a sofrer algo em “mat wrestling” pode sair do movimento com um simples murro ou cotovelada. É algo que pode ser usado entre dois lutadores que se respeitam e que querem derrotar-se um ao outro sem produzir grandes danos no oponente, mas quando assim não é, torna-se ridículo.


Porquê golpes tão aleatórios?


Não é algo tão sem sentido como os tópicos anteriores mas lembro-me de ver combates do Ric Flair em que este passava a contenda toda a trabalhar na perna do adversário para depois avançar para um doloroso “Figure Four Leg Lock” e vejo que isso de facto é um bom exemplo de algo coerente e com sentido no pro wrestling.

No entanto, hoje em dia, vejo lutadores que não se centram numa zona em particular de forma a isolá-la, limitar o adversário e fazer toda a sua ofensiva tendo em vista tal membro do corpo, finalizando com um golpe potente. Se olharmos para um John Cena e para o seu “STF”, reparamos que nos seus combates, se não estou em erro, ele não faz um único golpe que se centre no pescoço ou perna do adversário, as zonas (supostamente) mais afectadas com tal submissão.

Percebo que pode ser uma submissão que não precise de um trabalho antes numa zona para ser dolorosa e susceptível a um “tap out”, no entanto, muitos lutadores, mesmo os que não usem submissões, têm uma ofensiva muito pouco coerente, não se centram numa zona do corpo para um teoricamente mais fácil KO mas fazem golpes apenas para ir deixando o adversário no chão.


Porque é que o “finisher” de uns é apenas mais um da lista do “move-set” de outros?

De facto é estranho vermos o Edge durante anos a usar o “Impaler DDT”, e era um golpe do qual todos os lutadores se safavam, depois ele retira-se e passados uns meses temos o Alex Riley a usar esse golpe como “finisher”. As diferenças às vistas dos fãs não são nenhumas.

Vermos um Edge a usar o “Spear” como “finisher” e essa mesma manobra não servir para acabar os combates quando usada por um Batista ou por um Big Show, que até são lutadores em que o golpe parece ter mais impacto, é ridículo.

Falando em “DDT’s”, é estranho o Tommy Dreamer e até o Cody Rhodes usarem há algum tempo esse golpe como “finisher” e depois vemos um Randy Orton a usar um que pelo menos a mim me parece mais potente e doentio e não é com ele que consegue vitórias.

Podia falar também do “finisher” do Sting, chamado “Scorpion Death Drop” mas que não passa de um “Inverted DDT”, o mesmo que muitas vezes é aplicado por Christian por exemplo, mas sem lhe dar a vitória, e ele até o usa algumas vezes a partir do canto.

Na minha opinião, se não tiverem em atenção pormenores destes, só se dá a entender que o wrestling é falso.


Porquê cadeiradas só nas costas?

Mete-me alguma confusão ver lutadores a poderem acabar uns com os outros ao desferir cadeiradas na cabeça e por alguma razão preferem dar cadeiradas nas costas do adversário.

Obviamente que tudo isto “off screen” é justificado para uma protecção dos lutadores, e quando alguém não cumpre essa protecção, é multado como o caso de Undertaker e Triple H na última Wrestlemania, no entanto, acho estúpido tanto na WWE como mais recentemente na TNA não terem feito nada “on screen” que fizesse com que os fãs percebessem a razão de já não haver cadeiradas na cabeça. Bastava dizerem que quem o fizesse era suspenso e os fãs percebiam, no entanto, não dizem nada.


Porquê tirar os monitores da mesa dos comentadores quando um wrestler se prepara para projectar lá outro?

Desde que vejo wrestling e alguém se lembra de partir uma mesa dos comentadores através de uma projecção a outro lutador ou de um “diving” lá para cima reparo (e certamente vocês também) que a primeira preocupação dos wrestlers é tirar os monitores da mesa. E na altura em que eu era um “mark” punha-me a pensar: “Porquê? Tenho a certeza que se os monitores lá continuassem o dano causado no outro lutador era maior!”

De facto causa-me alguma estranheza mas com o tempo em que fui compreendendo como esta modalidade mais ou menos funcionava, apercebi-me do porquê de tal acontecer, e é muito mau um “mark” chegar ao raciocínio de que eles só não retiram os monitores porque isso poderia causar lesões nos lutadores, quando estamos a falar de acontecimentos que geralmente só surgem entre dois (ou mais) indivíduos que querem causar danos uns nos outros.


É claro que muitas das questões que aqui coloco têm uma resposta fácil para a maioria dos leitores, e eu próprio as sei: é preciso dar uma singularidade a cada lutador, é preciso poupar quem trabalha para lutar na noite seguinte, é preciso jogar pelo seguro porque um golpe mal executado pode custar uma carreira, é preciso despertar emoções no público, entre outras respostas, mas respondendo a elas numa perspectiva de isto ser algo legítimo (e para isso funciona o “kayfabe”), poucas ou nenhumas são as respostas que justificam o que vemos.
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