Mac in Touch #35 - "Vocês sabem do que estou a falar!"
Mais uma quarta-feira, mais um Mac in Touch. Agradeço imenso o vosso feedback no último artigo, espero continuar a receber o mesmo. Lamento se não respondi na hora a todos os comentários, mas podem ir "checkar" a minha resposta aos mesmos, que ao "fecho desta edição" já lá estarão ;).
O tema de hoje é um certo desabafo sobre uma certa personalidade... e vou ter de manter esta postura "vaga" porque é sempre difícil falar de alguém enraizado no poder e fica bonito ilustrá-lo desta maneira.....
"Vocês sabem do que estou a falar!"
A última impressão de
“x” costuma ser aquilo que fica mais na retina de quem vê esta incógnita no
período entre a a última e a próxima vez que há um encontro com a mesma.
Trocando por miúdos, digamos que depois de um jantar de
curso bem regado vão para um sítio onde há muito par de pernas e de olhos com
quem socializar. Conhecem uma rapariga (ou um rapaz, conforme a orientação de
quem me lê) e ficam a falar com ela/e a noite inteira. Levam-na ao táxi
(partindo do pressuposto que ambos são pessoas responsáveis e que ao adivinhar
uma noite com alcoól optaram por esta via para chegar a casa) dizem qualquer coisa completamente estúpida e
fora de contexto. Digamos “gosto de sardinha com feijão”. Ela assente
simpaticamente com o olhar, e entra dentro do táxi sem que haja o tal início de
acção que desejariam. Ficou com o vosso número, mas não receberam uma única
chamada e só depois de a encontrarem outra vez, por acidente, ela vai
descortinar que não são apenas o “sardinha com feijão”, são muito mais que isso
– uma pessoa inteligente, sensível e amável, com lógica no discurso, entrando o
alcoól como atenuante para o desastrado vomitado verbal com que a brindaram.
Ela gosta, é certo... mas entre o primeiro e o segundo encontro tem a cabeça
completamente feita em relação a vocês e toma-vos como lunáticos, pessoas
não-dignas da sua atenção.
É assim no mundo dos relacionamentos, é assim no showbiz. A
última piada do stand-up comedian tem de fazer rir o público mais do que
qualquer outra; a última cena de uma peça de teatro tem de ser inesquecível; a
última música do encore tem de deixar os fãs vidrados e sedentos de mais.
O wrestling não foge à regra, portanto. A imagem que fecha um show normalmente costuma ser aquela que mais fica na retina de quem o vê. Aquela cena que costuma ser o destaque de todo o episódio, foi à volta daquilo que tudo antes foi construído e será sempre o cartão principal para quem comenta o evento no dia a seguir, seja entre amigos ou profissionalmente.
As últimas duas Monday Night RAW’s, programa-bandeira da
WWE, tiveram no main event um nome comum: Curtis Axel. O novo agenciado por
Paul Heyman esteve nos dois combates e logo frente a enormes estrelas de
gerações, nomes que podem até confundir-se com as respetivas épocas. Primeiro foi
Triple H, depois John Cena.
Ambos os combates foram vencidos por Axel, sempre pela mesma via: count-out... mas o propósito pareceu ser outro:
- Depois de atirar com Axel para fora do ringue, HHH começa-se a sentir indisposto, senta-se numa cadeira, refresca-se, tenta reerguer-se mas cai... e essa é a imagem que passa – a etrela antiga está cada vez menos disposta a estas andanças, está em queda. É com uma imagem dele, cansado, que termina a RAW.
- No combate com Cena, uma ambulância entra na “zona de espectáculo”, o campeão da WWE sai do ringue desperto pela curiosidade e pela vontade de enfrentar um lutador que ele irá encontrar no próximo PPV com a estipulação final de um 2/3 Falls de Ambulance Match. A distracção custa-lhe o combate, Ryback aparece depois e ataca Cena, ficando por cima. A imagem de Cena no chão é mostrada e bem evidenciada como se deve fazer... mas a imagem que encerra a RAW é a de Curtis Axel com a mão erguida por Paul Heyman, dando relevo à sua vitória.
Sendo Axel um lutador “novo” e, aparentemente, alguém para
ser levado a sério pelo público e pela própria WWE, deve receber o máximo de
push que fôr possível obter. Ninguém pede vitórias limpas, mas dar-se a
entender que foi um lutador “velho” que perdeu e não um “novo” que ganhou
tira-lhe muito crédito. E a imagem que passa é a da degradação do primeiro em
vez da seriedade com que deve ser encarado o segundo. Não deveria ser assim...
... ou a ser, os papéis deveriam estar trocados porque Axel derrotou o maior campeão em título da WWE e isso foi muito mais evidenciado, fazendo agora sentido que ele se intrometesse na disputa do mesmo... caso contrário, encontraríamos um buraco que só poderia ser tolerado ou menos evidente caso a vitória, lá está, não fosse tão evidenciada. Mas não foi assim que a WWE, ou um membro da sua equipa criativa decidiu que fosse. Valorizou-se mais a vitória sobre o campeão do que sobre o homem da “velha guarda”, e esta história teve tanta importância como a derrota de quem está no topo da hierarquia atual da companhia.
Estranho? Para quem anda nestas vidas há tempo suficiente e/ou
sabe das polítiquices que contaminam o balneário de uma grande companhia de
wrestling influenciando as suas histórias, não o será. Não o é para mim. Para
mim, estranho é alguém que já se tornou tão grande, achar que precisa de se
tornar maior, é ter sede de ficar na história da indústria a todo o custo,
mesmo que se dificulte a sua sustentabilidade... estranho é ter-se um complexo
de inferioridade quando já se conquistou tanto e tanta influência se tem para
contornar uma derrota ou algo que prejudique a sua personagem.
E como diria Óctavio Machado, “Vocês sabem do que estou a
falar!”.e